15/12/2021 – Anoreg/MS – Campanha Sinal Vermelho: cartórios de Mato Grosso do Sul como ponte para apoio e proteção às mulheres

A Anoreg/MS conversou com a coordenadora do programa Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Família do TJ/MS, juíza Helena Alice Machado Coelho, sobre as ações de combate à violência doméstica no estado. 

 

Desde outubro, as serventias extrajudiciais de todo o país são pontos de apoio às mulheres vítimas de violência doméstica, incluindo os 174 cartórios de Mato Grosso do Sul, por meio da Campanha Sinal Vermelho de combate à violência doméstica.  A ação tem como meta incentivar denúncias por meio de um símbolo: ao desenhar um “X” na mão e exibi-lo no cartório, a vítima poderá receber auxílio e acionar as autoridades.  

 

A campanha é uma resposta conjunta ao recente aumento nos registros de violência em meio à pandemia, que teve como uma de suas consequências a exposição de mulheres e crianças a uma maior vulnerabilidade dentro do próprio lar.

 

A Associação de Notários e Registradores do Estado de Mato Grosso do Sul (Anoreg/MS) conversou com a coordenadora do programa Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Família do TJ/MS, juíza Helena Alice Machado Coelho, sobre as ações de combate à violência doméstica no estado sul-mato-grossense. Confira a entrevista: 

 

Anoreg/MS – Qual o atual cenário referente aos crimes de violência doméstica em Mato Grosso do Sul? Houve aumento durante a pandemia?  

Juíza Helena Alice Machado Coelho – A pandemia ocasionou significativo aumento da violência doméstica e familiar contra as mulheres no mundo todo. Acredita-se que isso se deva à maior vulnerabilidade da mulher nesse contexto, visto que a violência doméstica é um fenômeno que ocorre principalmente no ambiente privado e medidas como isolamento e distanciamento social exigidas, sobretudo nos primeiros meses de pandemia, são consideradas fatores de risco. Além disso, a redução da renda familiar, o desemprego, o uso abusivo de álcool e drogas ilícitas acabam por agravar o problema.   

Em Mato Grosso do Sul, o cenário não seria diferente. Embora, inicialmente, alguns indicadores tenham demonstrado redução dos pedidos de medidas protetivas de urgência, verificou-se expressivo aumento de outros indicadores, como por exemplo os números de atendimentos da Guarda Civil Metropolitana, números de descumprimento de Medidas Protetivas em Campo Grande. Ademais, e principalmente, observamos aumento expressivo – de quase trinta por cento – nos casos de feminicídios consumados em MS no ano de 2020, em comparação ao ano de 2019.   

 

Anoreg/MS – Quais são as principais formas de denúncia? Elas chegam por meio da própria vítima ou de terceiros (vizinhos, familiares, denúncia anônima)?   

Juíza Helena Alice Machado Coelho – A maior porta de entrada das mulheres em situação de violência doméstica ou familiar ainda são as delegacias de polícia. Em Campo Grande, temos a Casa da Mulher Brasileira, que além da delegacia especializada, também reúne outros serviços de atendimento à mulher. Em geral, a própria vítima realiza a “denúncia”, mas também pode ocorrer que terceiros relatem, ainda que de forma anônima, a situação de violência pelo telefone 180. Além disso, durante a pandemia, lançamos o projeto Protetivas On-Line como mais uma ferramenta para proporcionar às mulheres o acesso à Justiça, sobretudo, às medidas protetivas de urgência. Trata-se de um link que a mulher pode acessar na página do TJMS, onde ela preenche algumas informações e o pedido é direcionado à juíza da 3ª Vara de Violência Doméstica que funciona na Casa da Mulher. O questionário apresentado à mulher que acessa a ferramenta foi inspirado no Formulário Nacional de Avaliação de Risco e tem se mostrado muito eficiente no que se refere à identificação do fato e do risco a que a mulher está submetida.  

 

Anoreg/MS – De que maneira a Coordenadoria Estadual da Mulher atua no auxílio a essas vítimas?  

Juíza Helena Alice Machado Coelho – A Coordenadoria não é um órgão que realiza atendimento às mulheres. Atuamos na promoção da Política Nacional de Enfrentamento à Violência Contra às Mulheres e agimos diretamente com ações que visam aperfeiçoar a atuação do Poder Judiciário Estadual, fomentando e promovendo ações de formação inicial e continuada para juízas e juízes, servidoras e servidores do PJMS para o atendimento especializado, humanizado e eficiente a essas mulheres em situação de violência. Também contribuímos para o trabalho em rede, porque além de a Coordenadoria ser parte da Rede de Enfrentamento, temos um programa específico para promover o fortalecimento das redes de atendimento, com ações em quase 30 municípios e/ou distritos de Mato Grosso do Sul. Outro aspecto das atribuições das Coordenadorias Estaduais da Mulher é a atuação no âmbito da prevenção, razão pela qual desenvolvemos diversos projetos, programas e ações para disseminar informações a toda a sociedade.  

 

Anoreg/MS – De que forma o órgão trabalha preventivamente para que os crimes contra a mulher sejam evitados?  

Juíza Helena Alice Machado Coelho – A Coordenadoria da Mulher promove a articulação interna e externa do Poder Judiciário com outros órgãos governamentais e não-governamentais para a concretização dos programas de combate e prevenção à violência doméstica contra a mulher, além de desenvolver ações de conscientização e sensibilização, nos mais diversos espaços (escolas, canteiros de obras, assentamentos, salões de beleza, barbearias, grupos reflexivos, entre outros).  

 

Anoreg/MS – O que motivou a criação da campanha Sinal Vermelho como mecanismo de combate e prevenção à violência doméstica e familiar?  

Juíza Helena Alice Machado Coelho – Motivada pelo aumento dos casos de violência doméstica e familiar no período pandêmico, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançaram a Campanha Sinal Vermelho oficialmente no dia 10 de junho de 2020. A proposta é um ato simples: um “X” vermelho desenhado na palma de uma das mãos, mas que pode salvar muitas vidas.  É mais uma ferramenta à disposição das mulheres em situação de violência e já salvou dezenas de vidas em nosso país.  

A campanha conta com o apoio de farmácias em todo o país, e, agora, com os cartórios, que ao verem o sinal imediatamente podem acionar as autoridades policiais.  

Tem-se notícia que em nosso estado duas mulheres no estado de Mato Grosso do Sul denunciaram a violência valendo-se da Campanha Sinal Vermelho. 

 

Anoreg/MS – No final do mês de outubro, os 174 cartórios extrajudiciais do estado do Mato Grosso do Sul aderiram à campanha Sinal Vermelho, funcionando como ponto de apoio às mulheres vítimas de violência doméstica. Qual a importância da participação dessas serventias?  

Juíza Helena Alice Machado Coelho – A violência contra a mulher é um fenômeno que atinge democrática e negativamente toda a sociedade, portanto é fundamental o engajamento e união de esforços de todas as pessoas em ações afirmativas que promovam transformação social, como a campanha sinal vermelho.  

Soube que os cartórios extrajudiciais de todo o país também apoiam esta campanha e, fiquei feliz em saber que Mato Grosso do Sul contará com 174 cartórios como ponte para apoio e proteção às mulheres. Os serviços deste seguimento estão cotidianamente presentes na vida de muitas pessoas e essa valiosa ação vem somar esforços.   

 

Anoreg/MS – A 2ª edição do “Relatório do Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul sobre Feminicídio”, do TJMS, mostrou que o feminicídio aumentou cerca de 30% de 2019 para 2020. Acredita que a campanha auxiliará na redução desses números?   

Juíza Helena Alice Machado Coelho – Sim, acredito que toda ação que visa o atendimento, acolhimento e proteção da mulher em situação de violência doméstica impacta nos casos de feminicídio. Sabemos que quando um caso chega neste ponto, o do feminicídio, a vítima já passou por várias situações de violência. Então, toda forma de interromper esse ciclo auxilia na redução dos números da violência extrema – feminicídio. E a campanha foi pensada sob a ótica das peculiaridades apresentadas pela pandemia, da necessidade de outros canais de denúncia e de pedido de ajuda, pois foi o momento que as mulheres ficaram ainda mais confinadas no espaço doméstico, na companhia de seus algozes. Além disso, a campanha tem um potencial enorme de elevar o grau de conscientização da sociedade sobre o problema da violência doméstica, que antes da pandemia já apresentava altos índices. O fato é que, apesar de pensada para o período de pandemia, a campanha “pegou”, tanto que virou lei federal e em vários estados.  

 

Anoreg/MS – No dia 25 de outubro também foi sancionada a Lei nº 5.703, que institui no estado de Mato Grosso do Sul a campanha “Sinal Vermelho”. Qual a importância desta iniciativa ser assegurada por lei?  

Juíza Helena Alice Machado Coelho – Sem dúvida, a implementação do programa por meio de lei dá mais força à ação, regulamenta o funcionamento e envolve vários setores da sociedade. Esse último aspecto já é previsto na Lei Maria da Penha desde sua promulgação, em 2006, mas com uma campanha específica, instituída por lei, (temos, ainda, a Lei Federal nº 14.188, de 28 de julho de 2021, que definiu o programa Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica como uma das medidas de enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher em todo o território nacional) torna mais potente a atuação da população junto aos serviços de enfrentamento e de atendimento à mulher em situação de violência. É preciso termos sempre em mente que a violência doméstica não é um problema só da mulher, ou da Justiça, mas diz respeito a toda a sociedade. Somente com a erradicação da violência de gênero teremos uma sociedade efetivamente justa e solidária.   

 

Fonte:  Anoreg/MS 

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