17.04.2023 – Arpen/MS – Registro civil para os povos indígenas: fundamental para o resgate à cultura

A data celebrada em abril, conhecida por Dia do Índio, desde o ano passado, é chamada de Dia dos Povos Indígenas, conforme a Lei14.402/22; a mudança de nomenclatura visa dar destaque a pluralidade e diversidade dos povos originários.

 

A falta de registro civil dos povos indígenas é uma demanda não só de Mato Grosso do Sul, mas de todo o Brasil. O decreto 6.289/07 institui o Compromisso Nacional pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento dos Povos Indígenas, ampliando o acesso dos indígenas aos Cartórios de Registro de Pessoas Naturais para obter sua certidão de nascimento.

 

Mato Grosso do Sul reúne em seu território oito diferentes etnias, sendo o segundo estado mais numeroso em relação à população indígena.

 

A Arpen/MS conversou com o presidente da Comissão Permanente de Assuntos Indígenas – COPAI/OAB/MS, o advogado Christopher Pinho Ferro Scapinelli, sobre a importância do registro civil dos povos indígenas como uma forma de garantia da cultura e da identidade desses brasileiros. O presidente da Copai também falou sobre a diferença da certidão de nascimento e do Registro Administrativo de Nascimento de Indígena (RANI).

 

Confira na íntegra:

 

Arpen/MS: Dentre a população indígena no Estado, quais são as etnias presentes e onde se concentram?

 

Christopher Scapinelli: Mato Grosso do Sul possui a segunda maior população indígena do Brasil. São 73.295 mil, segundo dados do último Censo do IBGE de 2010, e abriga oito etnias: Atikum, Guarani Kaiowá, Guarani Ñandeva, Guató, Kadiwéu, Kiniquinau, Ofaié e Terena. As etnias estão concentradas nos Municípios de Aquidauana, Bodoquena, Bonito, Brasilândia, Campo Grande, Corumbá, Dois Irmãos do Buriti, Jaraguari, Miranda, Nioaque, Porto Murtinho, Rochedo e Sidrolândia.

 

Arpen/MS: Qual a maior dificuldade na questão da documentação indígena, especialmente certidão de nascimento?

 

Christopher Scapinelli: A missão institucional da Funai consiste em promover e proteger o direito dos povos indígenas, inclusive os direitos sociais. O acesso à documentação básica é um dos direitos que a Funai tem como missão institucional. Em 2007, o Governo Federal publicou o Decreto 6.289/07 , que institui o Compromisso Nacional pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento, sendo que os indígenas podem acessar os Cartórios de Registro de Pessoas Naturais para obter sua certidão de nascimento. Os indígenas têm todo o direito de se registrarem e a seus filhos independentemente da presença da Funai. Assim como qualquer cidadão brasileiro com seus direitos plenos o indígena tem direito a emissão dos documentos: Registro Civil de Nascimento – RCN / Certidão de Nascimento

 

RANI – Registro Administrativo de Nascimento de Indígena

Carteira de Identidade – RG

Cadastro de Pessoa Física – CPF

Carteira de Trabalho e Providência Social – CTPS

Título de Eleitor

 

Com a operacionalização cada vez mais informatizada acreditamos que mesmo com a falta de estrutura da FUNAI em diversos Municípios está sendo mais fácil o acesso do cidadão indígena a emissão de seu documento, sendo que a falta de informação em sua grande maioria é o principal obstáculo a esse acesso primordial.

 

 

Arpen/MS: O indígena pode solicitar o RANI, qual a diferença entre esse documento e o registro civil de nascimento?

 

Christopher Scapinelli: O Registro Administrativo de Nascimento de Indígena (RANI) é um documento administrativo fornecido pela Funai, instituído pelo Estatuto do Índio, Lei nº 6.001 de 19 de dezembro de 1973: “O registro administrativo constituirá, quando couber, documento hábil para proceder ao registro civil do ato correspondente, admitido, na falta deste, como meio subsidiário de prova”. Importante salientar que esse é um documento administrativo emitido pela FUNAI e não substitui a certidão de nascimento, apenas sendo um documento comprovatório para acesso a demais serviços e direitos do cidadão indígena.

 

Arpen/MS: Ter o nome indígena na certidão de nascimento não pode ser negado pelo registrador no cartório, mas os indígenas optam pela inserção do nome indígena em seus documentos?

 

Christopher Scapinelli: O plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou resolução conjunta com o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para regulamentar o registro de nascimento de indígenas. De acordo com a referida norma o registro de nascimento de indígena no Registro Civil de Pessoas Naturais é facultativo e prevê que sejam incluídas, no registro de nascimento,  informações relativas à sua origem indígena, caso haja interesse.

 

Entre as informações que podem ser registradas no documento estão o nome indígena e a etnia, que poderá ser lançada como sobrenome. A aldeia de origem do indígena e a de seus pais também poderá constar juntamente com o município de nascimento, no espaço destinado às informações referentes à naturalidade.

 

Ressalvamos que o cidadão indígena já registrado pode solicitar a retificação de seu registro utilizando os critérios acima mencionados.

 

O registro tardio do indígena poderá ser feito de três formas: com a apresentação do Registro Administrativo de Nascimento do Indígena (Rani), por meio de requerimento e apresentação de dados feitos por representante da Funai e, no lugar de residência do indígena, de acordo com o artigo 46 da Lei 6.015/73.

 

Com relação ao questionamento, acreditamos que a falta de informação e a inexistência de uma legislação menos burocrática são os grandes entraves para a efetivação do direito de registro de seu sobrenome, o que veio a modificar com a adoção da Resolução do CNJ ao permitir esse registro com as características da pessoa e dados sobre sua naturalidade, o que auxiliar na implementação da política de inclusão e facilitação de acesso a direitos básicos.

 

Arpen/MS: Atualmente é possível incluir no registro de nascimento além do sobrenome étnico a aldeia de origem da criança indígena. Como a inclusão dessas informações podem ser avaliadas? Qual o impacto?

 

Christopher Scapinelli: Conforme questão anterior, sim é possível e acreditamos que se tratam de informações importantes, relevantes e que reafirmam a cultura e reforçam os laços familiares indígenas, reavivando o orgulho do cidadão indígena.

 

Arpen/MS: Caso o indígena tenha sido registrado sem seu sobrenome étnico, ele pode pedir a alteração em sua certidão de nascimento? Qual o procedimento deve seguir?

 

Christopher Scapinelli: Sim ele poderá pedir a retificação do registro bastando procurar o Cartório de Registro de Pessoas Naturais do Município onde reside.

 

Arpen/MS: Podemos afirmar que o registro civil tem importante papel da conservação da cultura dos povos indígenas?

 

Christopher Scapinelli: É fundamental pois resgata o orgulho por uma cultura tão bela e tradicional em nosso país e refirma os princípios e garantias constitucionais pactuadas pela Constituinte de 1988.

 

Fonte: Arpen/MS

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