G1 – Ação de usucapião é movida na Paraíba para regularizar a maior população cigana do Nordeste

Segundo o MPF, são 522 famílias ciganas da etnia Calon que formam a maior comunidade cigana geograficamente fixada do Nordeste e que precisam de garantias de moradia.

As 522 famílias ciganas da etnia Calon que moram em Sousa, no Sertão da Paraíba, podem ser beneficiadas por uma ação ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) para que seja declarada a usucapião coletiva de seus imóveis. Juntas, elas formam a maior população cigana geograficamente fixada do Nordeste brasileiro, com 1.845 pessoas.

O ajuizamento da ação é um passo no processo de regularização da terra. Agora, o tema será submetido ao Poder Judiciário, que vai decidir ou não sobre a usucapião coletiva. De toda forma, mesmos em saber se a ação vai ser deferida, o líder comunitário Francisco Figueiro, conhecido como Bozzano, vê este reconhecimento do MPF como uma grande vitória.

Para ele, a ação significa liberdade. O líder cigano conta que empresários de Sousa estavam ocupando terras vizinhas cada vez mais próximas de suas residências com o objetivo de lentamente avançar sobre as terras tradicionais ciganas e depois reivindicar seu uso.

“Eles já estavam construindo muito perto da nossa residência e imprensando a gente. Nós temos nossa cultura, nossa língua, nosso dialeto próprio, e estávamos sendo proibidos de usar o que é nosso”, explica.

Estruturada em quatro comunidades, a população cigana em Sousa é constituída por pessoas de baixa renda que ocupam o local desde 1963. Bozzano conta que quem chegou primeiro foram seus bisavós, que construíram um rancho e abandonaram o nomadismo.

O então prefeito da cidade, Antônio Mariz, concedeu o terreno para a população – mas como na época os ciganos não tinham documentos, tudo foi acordado no aperto de mão e sem comprovação legal.

“A gente precisa saber que tem um lugarzinho para descansar, para deixar a nossos filhos. A gente tem que dar uma moradia digna porque a eles. A gente estava com medo de, num outro dia, não ter uma casa para morar. Ser botado para fora tendo em vista que estamos há mais de 40 anos no local. A gente precisava ter paz”, disse Bozzano.

Para a comprovação de usucapião urbana, a legislação exige cinco anos de posse como requisito. Apesar disso, o MPF apresentou fatos históricos que comprovam a posse exercida pelas comunidades ciganas no território nacional há muito mais tempo. Um exemplo usado foi a admissão da concessionária Energisa de que fornece energia elétrica para a comunidade desde os anos 80.

Além disso, testemunhas vivas foram usadas, como a presidente da Companhia Estadual de Habitação Popular (Cehap), Emília Correia Lima, que promoveu no governo de Antônio Mariz a construção de casas de alvenaria nas comunidades. “Nossa intenção é ainda realizar um projeto habitacional mais completo para melhorar a condição de habitação dos ciganos de Sousa”, disse ela.

Agora, o tema será submetido ao Poder Judiciário, que decidirá sobre o mérito da questão.

“A regularização do território da comunidade tradicional cigana representa um elemento essencial para a preservação da cultura cigana, de seus usos e costumes tradicionais”, disse o procurador da República Felipe Vasconcelos, autor da ação.

Conforme o procurador, a regularização tem uma importância muito grande, pois pode garantir o acesso a políticas públicas habitacionais, como a construção de moradias por parte da Cehap.

A disputa ainda segue, mas a comunidade já vê a ação do MPF como um passo muito importante para sua etnia. “Os mais velhos sempre vinham lutando, mas nunca conseguiram. Nós estamos aqui para dar andamento e lembrar a memória deles”, finalizou Bozzano.

Fonte: G1